A temática do sono e do sonho ainda é, em parte, um mistério para a ciência: há muitas teorias antagônicas entre si e, quando se trata do universo pet, a incógnita é ainda maior.
Será que sonham e será que também têm pesadelos? Para responder estas perguntas, é preciso primeiro entender como se dá o sono dos animais. Confira:
Rapid Eyes Movement
No mais, um dos consensos existentes é que os animais também apresentam a fase R.E.M do sono — que, em humanos, corresponde ao momento dos sonhos.
“'R.E.M.' é a sigla para Rapid Eye Movement, ou 'movimento rápido dos olhos'. É uma das fases do sono, e nos cães ela é geralmente curta. Dizer que eles têm sono R.E.M significa que eles atingem um sono profundo e podem sonhar”, explica Bruna Stafoche, professora do curso de medicina veterinária da Universidade Anhembi Morumbi.
Segundo Bruna, diferente dos seres humanos e primatas, os cachorros apresentam três fases do sono: “Ele é polifásico, com vários ciclos de vigília-sono durante o dia. É composto por três fases diferentes: vigília, sono de movimento ocular não rápido (N.R.E.M), também conhecido como sono de ondas lentas, e sono de movimento rápido dos olhos (R.E.M)”.
Cada ciclo de sono tem duração média de 20 minutos, com sonolência e sono N.R.E.M ocupando cerca de dois terços desse tempo e o R.E.M (quando ocorre) ocupando o outro terço.
“Em humanos, os ciclos de sono são uma sucessão claramente definida de diferentes estágios do sono N.R.E.M e um episódio de sono R.E.M, que fecha o ciclo. Como os cães dormem e acordam muitas vezes durante o dia, como consequência, o sono R.E.M dos cães é curto ou inexistente e as fases N.R.E.M são intermitentes, com despertares mais curtos ou mais longos”, continua Bruna.
Uma curiosidade sobre o estágio R.E.M é que os predadores costumam passar mais tempo nesta fase do que as presas — eles estariam menos vulneráveis enquanto dormem, já as presas precisam ficar mais alertas para poupar a própria vida.
Em humanos, o sono R.E.M é mais frequentemente seguido pelo N.R.E.M; mas cães e outros mamíferos são mais propensos a acordar logo após a fase R.E.M. Isso potencialmente reflete uma adaptação evolutiva para limitar o tempo gasto em um estado vulnerável, no caso do animal que é presa.
“O sono de presas é mais leve, justamente como defesa, por isso ficam menos tempo na fase R.E.M e, consequentemente, sonham menos. Porém, quando sonham, podemos dizer que o fazem de forma mais apreensiva”, explica Gustavo Augusto Keusch, médico-veterinário e docente no curso de Medicina Veterinária da Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS).
Como são os sonhos dos animais?
De acordo com Bruna, os sonhos têm alguma similaridade com o dia a dia do animal: “Eles podem se mover de certas formas que se assimilam com corridas, como se estivessem brincando, enfim, realizando atividades corriqueiras”.
Já a suspeita quanto aos pesadelos é que eles teriam alguma relação com os medos que os bichos enfrentam quando acordados — como tomar banho, ouvir barulhos altos, etc.
De forma geral, pesadelos são sonhos perturbadores, que estão associados a sentimentos negativos, como ansiedade ou estresse. “Mas não há como ter certeza do que realmente eles sonham”, diz a professora.
“É difícil definir exatamente o que eles sonham nos pesadelos, mas se fizermos um paralelo com a espécie humana, são momentos assustadores”, completa Gustavo.
Apesar de não podemos assegurar que o sonho se trata de um pesadelo, há alguns comportamentos que podem ser notados pelo tutor. Segundo o médico-veterinário, o animal se apresentará bastante agitado enquanto dorme, chorando ou até gritando, enquanto as movimentações e pequenas vocalizações são normais em sonhos.
Devo acordar o pet em pesadelo?
Se você suspeita que seu cão está tendo um pesadelo, não deve acordá-lo. Bruna explica:
“Assim como nós, eles podem se assustar e é muito comum que fiquem confusos nesse momento, podendo morder e gerar acidentes, principalmente se houver crianças envolvidas. É fundamental orientá-las a não acordar abruptamente os cães”, diz.
A intervenção deve ser feita apenas quando a agitação estiver fora de controle — neste caso, Gustavo indica tentar acordar o animal com tranquilidade e mostrar que você está calmo e perto dele.
“Para tentar evitar os pesadelos, busque entender se, na rotina do bicho, há algum evento que possa estar gerando medo, estresse ou ansiedade. Se não conseguir identificar nada e os sintomas continuarem, leve ao veterinário para, juntos, tentarem entender o que pode estar motivando esses episódios”, orienta.
Como tutor, é importante também garantir um sono tranquilo ao seu animal. “A rotina regular da hora de dormir pode ser útil para promover um ambiente adequado para um sono tranquilo, como desligar dispositivos eletrônicos e luzes, massagear ou acariciar calmamente o cão enquanto descansa e manter uma temperatura confortável no quarto onde o cão está dormindo”, diz Bruna.
Além disso, o aumento das atividades físicas diurnas e o enriquecimento ambiental são incentivados para que o cão fique cansado à noite e queira descansar.
Processo fundamental para os mamíferos, o sono pode ser privado por distúrbios que afetam as funções fisiológicas, aumentando o risco de doenças.
“O sono pode ser afetado por vários distúrbios em cães, incluindo narcolepsia, distúrbio comportamental do sono REM e distúrbios respiratórios obstrutivos (principalmente animais obesos e cães de raças de focinho curto)”, explica a professora.
Os distúrbios do sono também podem ser um sintoma de outras condições não relacionadas e podem contribuir para o agravamento dos sinais clínicos associados a elas.
Se notar qualquer anormalidade do sono ou do comportamento do seu cão, um médico-veterinário deverá ser consultado para investigação do problema.
Fonte: Revista Casa & Jardim
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